Foto: divulgação |
Você sente ter deixado telespectadores órfãos de sua presença na bancada?
Ana Paula Padrão - Eu ouço uma série de manifestações de pessoas que sentem falta de mim na TV, mas elas dizem TV, e não bancada. Eu acredito que deixei esse sentimento quando saí do “Jornal da Globo”. Ocupei muito aquele espaço e, de fato, muita gente dizia que adorava o jornal comigo, mas agora foi diferente.
Quer dizer que estrategicamente você foi mudando sua imagem?
Quando eu terminei o “SBT Brasil” e fui fazer o “SBT Realidade”, já com a minha produtora Touareg, achei que o mercado viria outras possibilidades em mim que não fosse a bancada. Tomei um susto quando o Silvio Santos disse que me queria de volta na bancada porque o mercado estava pedindo isso.
Você saiu do SBT porque não queria mais a bancada e foi procurada para fazer exatamente a mesma coisa?
O mercado veio atrás de mim com duas outras propostas para bancada. Percebi que, naquele momento, as pessoas e as emissoras me viam vinculada somente à bancada. Eu estava fazendo algo errado e precisava mudar essa imagem. Foi na mesma época em que eu já tinha começado a pesquisar sobre o universo feminino.
Aí surge o convite da Record justamente para a bancada...
Eu cheguei a insistir para que a Record pensasse em outras coisas paralelas à bancada, mas eles não toparam, então eu disse que poderia ajudar somente por quatro anos.
Na ideia de mudar sua imagem, em que a Record ajudou?
Eu me aproximei de outro público que eu não tinha e que hoje é muito importante para mim: o público C. Quando eu comecei a aplicar pesquisas lá fora e trouxe para o Brasil, identifiquei que só havia duas outras jornalistas com maior recall que eu. Aquela pesquisa me mostrou que eu era reconhecida nas classes A, B e C, mas percebi que precisava me aproximar mais da C, e foi isso o que a Record me proporcionou.
O “Jornal da Globo” deixou sua imagem ligada fortemente a um segmento específico?
Quando saí do SBT, ainda estava com a imagem muito ligada ao público AAA e a temas relacionados a hard news, política e economia, apesar da imensa quantidade de matérias que eu havia feito sobre mulheres. Agora, transito nos bairros periféricos e sou conhecida por ter essa identificação.
Como foi a execução dessa pesquisa que acabou na criação do Tempo de Mulher?
Quando comecei a executá-la, pesquisei plataformas de comunicação digitais e presenciais com e para mulheres. Quando trouxe a pesquisa ao Brasil, contratei um instituto e fizemos um ano de levantamento sobre as mulheres em corporações e identificamos quais eram os entraves para que ela chegasse a níveis mais altos. Vários indicadores apontavam que eu deveria começar com a plataforma que me desse maior visibilidade, que é a digital, e, com dois anos de Record, lancei o Tempo de Mulher.
Então você não criou um portal para mulher somente, o site era um dos produtos contemplados em sua estratégia?
Sim, tanto que o portal explodiu e no primeiro mês teve 23,5 milhões de visualizações; hoje, mantemos entre 28 e 30 milhões por mês, o que é espetacular em qualquer lugar do mundo. Com isso, eu disse “opa, deixa eu antecipar as outras coisas para não acharem que o Tempo de Mulher é só um portal”. Foi aí que realizei dois grandes eventos.
Pesquisa acabou se tornando um mantra para você?
Não faço mais nada sem pesquisa. Dá certo. Depois de pesquisar muito, os números me disseram o que eu deveria fazer, e depois que lancei o portal também comecei a aplicar pesquisas específicas para layout, cores, tipografia e outras coisas. Tanto que, quando colocamos o portal no ar, não houve rejeição.
Hoje as empresas já reconhecem que você não é apenas uma jornalista famosa, mas uma produtora de conteúdo?
O que as empresas queriam antes é que minha imagem ajudasse a vender. Mas eu as treinei para assimilarem que o conhecimento que eu produzo vai ajudar a vender. Tanto que eu não faço merchandising e nem publicidade. Partindo desse princípio, o que eu posso dar é o conhecimento que tenho sobre a mulher brasileira.
Você foi até as empresas para passar isso?
Durante muito tempo fui em muitas empresas para comunicar o que eu estava fazendo. Não fiz nenhuma mídia, nem mesmo o portal teve mídia. Fiz uma ação voltada ao discurso. Eu precisava me apresentar, ir lá, conversar. Mesmo nos eventos, fiz questão de estar no palco todo o tempo para mostrar meu grau de envolvimento. Eu definitivamente soube que tinha atingido meu objetivo quando deixei a Record, e a reação do mercado não foi de choque, mas de compreensão.
Em que estágio está o discurso da igualdade de gêneros no Brasil?
O feminino nos abriu muitas portas com a premissa de que homens e mulheres eram iguais. Mas homens e mulheres não são iguais. Eles têm necessidades muito diferentes. Equidade é uma coisa. Agora, ter de virar homem para trabalhar, que foi o que aconteceu com as mulheres que entraram no mercado de trabalho, não pode. Mulheres não precisam mais se masculinizar para ter uma carreira bem-sucedida.
É claro que você lida com negócios, mas também tem um pouco de militância nesse seu empenho em relação ao tema?
Claro que existe. Se eu posso colocar minha imagem a favor de alguma coisa, que seja pertinente à minha história. Sou uma mulher dos anos 1980 que entrou no mercado e que fazia o que as mulheres daquela época estavam fazendo: copiando os homens. Mas eu entendi que não precisava copiar, eu podia ser mulher com vida pessoal, feminilidade e casamento feliz. Uma mulher que não ficasse enfiada até 12 horas dentro de uma empresa. Quero que outras mulheres tenham essa oportunidade.
Você descarta qualquer possibilidade de voltar à TV ?
Deixei a bancada para me dedicar aos negócios. Agora, quer dizer que nunca mais vou voltar para a televisão? Não. Se a proposta combinar com meu negócio, eu posso muito bem aceitar, mas isso aqui [as empresas] representa minha prioridade hoje.
Recebeu muitas propostas assim que saiu da Record? Você estaria conversando com emissoras de TV paga?
Sim, desde que saí recebi muitas propostas, tudo o que você imaginar, até para política. Acredita? [risos]. Estou sim conversando com outras emissoras, inclusive de TV paga, até porque, com a lei da TV a cabo de conteúdo nacional, muitos canais têm nos procurado [a Touareg] para produzirmos conteúdo.
Reprodução do site: Portal Imprensa
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