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quinta-feira, 21 de março de 2013

" A casa dos velhos"

Repórter de verdade, nas palavras de Eliane Brum, "atravessa a rua de si mesmo para olhar a realidade do outro lado de sua visão de mundo". Embora minha admiração pelo trabalho de Eliane venha de longa data, pouco sabia de seus fundamentos sobre o jornalismo, com os quais concordo integralmente, exibidos aqui como instrumento oportuno de ligação entre os capítulos. São práticas de conduta simples, mas simbolicamente corajosas por se oporem, nestes tempos, à corrente dominante nas redações brasileiras, reféns da arrogância e de maniqueísmos. (Caco Barcellos)

Ler, entender, sentir, viver e contar uma história. É isso que a jornalista e escritora Eliane Brum faz na reportagem "A casa de Velhos" no livro "O olho da rua".

Por que ler "A casa dos velhos" da escritora Eliane Brum?

A Casa de Velhos é uma de minhas reportagens preferidas – e é a que mais me dói. Ainda hoje ela dói muito. Porque errei feio.

Eu perambulei por vários asilos em São Paulo. Não gosto de eufemismos como casa de repouso e afins, assim como não gosto de idosos, terceira idade, melhor idade. No caso da velhice, eufemismos e diminutivos me parecem uma indignidade, não se viveu tanto para ser reduzido a “inho”. Mas perambulei por asilos pobres, chiques, de todos os tipos. Então os colegas da sucursal do Rio de Janeiro me sugeriram essa casa. Fiz uma ponte aérea para conhecê-la e soube de imediato que minha busca acabava naquele portão de ferro que descobriria tão trágico.

Não foi fácil escrever essa reportagem. Em geral eu sento e escrevo, tenho a sensação de que a matéria já estava escrita dentro de mim. E em geral é assim mesmo: eu escrevo primeiro dentro de mim, ao longo dos dias de apuração, quando estou acordada e quando estou dormindo. Costumo dizer que fico grávida da matéria, o que altera meu humor e meu metabolismo. Não é fácil me agüentar dentro de casa nesses dias de gestação de reportagem. Fico quieta, sorumbática. Passo uma semana num asilo ou vinte dias no meio do mato e quando volto não conto nada. Respondo às perguntas que me fazem com um olhar vago. Só consigo falar depois do parto do texto. Um comportamento encantador para quem convive comigo, como se pode imaginar.

Escrever, para mim, é um ato físico, carnal. Quem me conhece sabe a literalidade com que vivo. E, principalmente, a literalidade com que escrevo. Eu sou o que escrevo. E não é uma imagem retórica. Eu sinto como se cada palavra, escrita dentro do meu corpo com sangue, fluidos, nervos, fosse de sangue, fluidos, nervos. Quando o texto vira palavra escrita, código na tela de um computador, continua sendo carne minha. Sinto dor física, real e concreta, nesse parto. Sou tomada por essa experiência. E tenho vinte anos de jornalismo e vinte anos de briga com editores que não compreendem por que eu sangro um pouco em cada vírgula arrancada – ou colocada. E antes que alguém fique tendo idéias, sim, eu tenho uma larga estadia em divãs de psicanalistas.

Leia a reportagem na íntegra.

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